A um jovem Poeta

Você, que ainda é puro e sabe o quão fundamental é ela para a sua aventura de poeta, fica irado contra os outros, ao sentir que a sua presente agressividade é fruto de um complexo de culpa. É você, não os outros, quem está em crise. E se os outros também o estiverem, razão a mais para você afirmar-se em sua luta, que é a luta de todo poeta, para ajudá-lo a sair dela. Pois você não auxiliará ninguém, muito menos a si mesmo, se seu coração não estiver limpo de ressentimento e sua luta contra "o outro" não for constante. "O outro", não preciso dizer, é você próprio. É o súcubo que, todos, temos dentro de nós; o ser calhorda, comprável com a moeda da mentira e da lisonja, que de repente adota a gratuidade como norma, por isso que a paixão é mais insaciável que o infinito aberto em cima. E a paixão não se vende nunca.
Cada poeta é uma coisa em si, mas todos os poetas devem o mesmo à Poesia: a própria vida. Há, o poeta, que queimar-se e causar sempre mal-estar aos que não se queimam. Há que ser o grande ferido, o grande inconformado, o grande pródigo. Há que viver em pranto por dentro e por fora, de alegria ou de sofrimento, e nunca dizer "não" a ninguém, nem mesmo àqueles que optaram pelo não chorar.
Você meu caro Jovem Poeta, que foi dotado de talento e de beleza, não tem o direito de negar-se ao seu martírio. Só ele pode tornar a sua poesia emocionante. Só ele pode salvá-lo do formalismo em que caem os que se recusam a estar sempre despertos. É preciso que todos vejam a luz que seu coração transverbera, mesmo coberto por bons panos. Não negue o seu olhar de poeta aos homens que precisam dele, mesmo tendo o pudor de confessá-lo. Abra a sua camisa e saia para o grande encontro.
Vinicius de Moraes

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Missa e ofício marcam um ano de saudades do Seminarista Mario Dayvit

A Paróquia São José e São Pantaleão, o Seminário de Teologia convidam voce e sua comunidade para a celebração de um ano da partida de Mario Dayvit que se realizará no dia 04 de julho as 19:00hs na Igreja de São Pantaleão - centro.

Pela manhã, acontecerá no tumulo a oração do Ofício Divino das comunidades - Ofício dos fiéis defuntos - e as 18:30hs o terço da paz motivado pelos seminaristas. 
Logo em seguida acontecerá a celebração da Eucaristia.

Contamos com sua presença para mais este momento de fé e piedade cristã.

três Túmulos

A festa de São Pedro me faz lembrar a experiência vivida anos atrás, por ocasião da "visita ad limina”, a peregrinação aos "túmulos dos apóstolos”, que os bispos são convidados a fazer periodicamente.
Comecei minha peregrinação visitando o túmulo de São Pedro, em Roma. Ele se encontra no sub-solo da atual basílica de São Pedro. Ela está construída sobre um antigo cemitério, que ficava fora da cidade de Roma, do outro lado do Tibre.
As escavações arqueológicas, mandadas fazer por Pio XII, reconstituíram a série de edificações feitas no lugar onde hoje se encontra a atual basílica de São Pedro. Ela é a quarta das igrejas construídas no mesmo lugar, tendo todas como referência o mesmo ponto, indicado agora pelo centro da cúpula.
Pois bem, este ponto central conduziu os pesquisadores a identificarem um velho e tosco túmulo, ainda existente, contendo ossos de uma pessoa idosa. Não custa reconhecer que seriam os ossos do velho Pedro, morto em Roma, e lá enterrado.
Pois bem, aí começou minha reflexão. Pensei no rude pescador da Galileia, que teve a sorte de um dia ser convidado pelo Mestre a abandonar barco e redes, para empreender a aventura de se tornar "pescador de homens”. Que seria do pobre pescador, se o Mestre não o tivesse chamado?
Certa vez, o próprio Pedro pediu contas ao Mestre, perguntado pela recompensa que podiam esperar. "E nós, que deixamos tudo, e te seguimos, o que teremos?”.
O pobre Pedro mal podia imaginar o tamanho do monumento que seria construído em sua honra. A promessa do Mestre se cumpriu de modo generoso e impressionante. "Cem vezes mais neste mundo, e a vida eterna no outro”. O impressionante túmulo de Pedro, feito igreja para acolher a multidão, é símbolo vivo da recompensa que aguarda todos os que põem sua esperança no Mestre.
Depois, prossegui minha peregrinação rumo à Terra Santa, passando pelas pirâmides do Egito. Visitamos as três mais famosas, construídas para guardar os restos mortais de Quéops, Quéfren e Miquerinos. Impressionam por sua grandeza, e pela nobre intenção de garantir alguma sobrevida aos Faraós que as tinham mandado construir como repouso perpétuo de seus corpos.
Tive o atrevimento de subir pela íngreme escada interna, que leva ao centro da pirâmide de Quéops, onde estava seu sarcófago. Hoje a ampla sala está totalmente vazia.
As pirâmides ficaram abandonadas por séculos. Os ladrões vieram, levaram os sarcófagos de ouro com as múmias dos faraós, e ninguém sabe onde foram parar.
Tiveram sua finalidade frustrada. De nada adiantou construir túmulos tão solenes e impressionantes. A morte tragou a fama fugaz dos faraós.
Em 1922, pesquisadores ingleses descobriram a pequena pirâmide subterrânea, dedicada a Tutankamon, o faraó que morreu aos 19 anos de idade. Encontrada ainda intacta, a pirâmide mostrou exuberância de riqueza. A sala onde estava o sarcófago tinha três camadas sucessivas de paredes, todas de ouro puro, até a parede mais próxima que guardava o sarcófago, também ele de ouro fino. Se assim era a sala do jovem Tutankamon, como não seriam as salas dos Faraós famosos?
Não sobrou nada. Nem sequer as múmias.
Chegando em Jerusalém, fui ver a igreja que guarda o túmulo de Cristo. Pequeno, simples, despretensioso, cumpriu bem sua finalidade. Alugado, hospedou provisoriamente seu inquilino por três dias. Permanece vazio até hoje, testemunha incômoda e irrefutável. Ele não diz tudo. Mas garante que seu inquilino já não se encontra lá.
Não é o tamanho do túmulo que garante nosso destino. Jesus fez questão de nos avisar: ele foi à frente, nos preparar um outro lugar, "onde os ladrões não roubam, nem as traças corroem”.

Dom Demétrio Valentini
Bispo de Jales (SP) e Presidente da Cáritas Brasileira

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Artistas católicos interpretarão sucessos do Padre Zezinho

No dia 15 de julho, sexta-feira que antecede o 7° Mutirão Brasileiro de Comunicação será realizado na PUC-Rio o show “Padre Zezinho, 70 anos pensando em Deus”. A partir das 20 horas, diversos artistas católicos interpretarão sucessos do padre.

Ao mesmo tempo em que reunirá participantes do Muticom que estiverem pelo Rio de Janeiro, o show será também a noite cultural e encerramento do Primeiro Curso de Comunicação para os Bispos do Brasil e ainda, uma comemoração pelo aniversário da Rádio Catedral.

Tantas comemorações só poderiam ser com um evento especial. O Padre Zezinho participará da noite em sua homenagem e já confirmaram presença os seguintes cantores: Padre Gleuson, Eduardo Soares, Aline Venturi, Ghislaine Cantini, Bruno Camutrati, Márcio Pacheco, Olivia Ferreira, Italo Villar e Leandro Souza. 

sábado, 18 de junho de 2011

Reunião do conselho permanente da CNBB em Brasília

PresidenciaMissa



“Eis que vos dou toda a terra, todas as plantas que dão semente e todas as árvores que produzem seu fruto com sua semente, para vos servirem de alimento” (Gênesis 1,29).

O Conselho Permanente da CNBB, reunido em Brasília, de 15 a 17 de junho de 2011, tomou conhecimento do atual estágio da discussão do Código Florestal no Congresso Nacional, atualmente tramitando no Senado, após votação na Câmara dos Deputados.
Estamos conscientes da grande importância de um Código Florestal no Brasil, porque nosso País tem possibilidades de oferecer alternativas à crise civilizacional ancorada, sobretudo, na crise climática.
Nossa preocupação maior está no impacto e nas consequências de uma lei deste porte na vida das pessoas e no meio ambiente, que sacrificam a realidade da ecologia física e humana ao influenciar na dinâmica social e cultural da sociedade.
A ecologia se tornou, na segunda década do século XXI, um dos “sinais dos tempos” mais significativos para a sobrevivência da humanidade. Não por acaso, vivemos o Ano Internacional das Florestas, participamos recentemente da Campanha da Fraternidade sobre a Vida no Planeta que colocou em discussão a gravidade da crise ecológica às vésperas da Conferência Rio+20.
A flexibilização da legislação ambiental, aprovada pela Câmara dos Deputados, motivo de muita polêmica, é prova contundente de que o País poderá se colocar na contramão deste importante debate mundial.
As decisões sobre o Código Florestal não podem ser motivadas por uma lógica produtivista que não leva em consideração a proteção da natureza, da vida humana e das fontes da vida. Não temos o direito de subordinar a agenda ambiental à agenda econômica.
Destaque-se, porém, que a legislação original, tanto de 1934 como de 1965, tinha como preocupação preservar a flora em suas múltiplas funções, seja em áreas públicas, parques nacionais, seja em áreas privadas e, nesse aspecto, sempre exigiu a manutenção de um mínimo da vegetação nativa.
Alguns aspectos, já aprovados na atual discussão sobre o Código Florestal, nos preocupam. Entre eles, destacamos:
- a flexibilização da Lei altera o regramento das Áreas de Preservação Permanente – APPs, que protegem as margens dos rios, encostas, topos de morro, ameaçando o equilíbrio de proteção das florestas;
- a anistia das multas e penalidades pelas ocupações e desmatamentos em áreas de agropecuária e de alta relevância ambiental.
No Novo Código Florestal não pode faltar o equilíbrio entre justiça social, economia e ecologia, como uma forma de garantir e proteger as comunidades indígenas e quilombolas e defender as pequenas propriedades e a agricultura familiar.
Convocamos nossas comunidades a participarem desse processo de aperfeiçoamento do Código Florestal, mobilizando as forças sociais e promovendo “abaixo-assinado” contra a devastação.
Somos chamados a cuidar da natureza, a nossa casa comum, num processo de desenvolvimento sustentável, para que a terra e tudo o que dela provém sirvam para que todos tenham vida e vida em abundância (cf. Jo 10,10).
Pedimos que Nossa Senhora Aparecida, mãe dos brasileiros e brasileiras, interceda junto a Deus muita luz para que nossos parlamentares se façam sensíveis ao bem comum.
P – Nº 0549/11
Brasília – DF, 17 de junho de 2011
Cardeal Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida - SP
Presidente da CNBB
Dom José Belisário da Silva
Arcebispo de São Luís do Maranhão-MA
Vice-Presidente da CNBB
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Prelado de São Félix-MT
Secretário Geral da CNBB

quinta-feira, 16 de junho de 2011

O sagrado e o cinema

De que maneira, em um mundo atravessado por um turbilhão de imagens, o Cinema ainda pode expressar valores essenciais e permanentes que nos levem ao conhecimento do Outro e ser um veículo para a manifestação de experiências que configuram o campo vivencial presente naquilo que chamamos de Religião?

Esses valores e experiências religiosas, não se manifestam exclusivamente nos filmes que veiculam temas personagens e símbolos tradicionalmente inscritos no corpo das religiões organizadas. Muitas vezes são esses mesmos filmes, reduções epidérmicas das situações profundas que configuram a religiosidade. Os Dez Mandamentos, de Cecil B de Mille, é muito mais um espetáculo cinematográfico que um filme que expresse vivências no campo do sagrado, ou que demarque os caminhos do humano vagando no mundo em busca de si mesmo. Não importa que a temática do filme seja profana.


O que vale é se esse filme é capaz de revelar as dimensões da busca do ser humano por sua face verdadeira, por uma espiritualidade forte que provoque a manifestação da transcendência.Por exemplo, em A Estrada da Vida, de Federico Fellini, ao final do filme, o brutamonte Zampanó, solitário, contempla o céu estrelado, o vazio de sua alma, arrepende-se do modo como abandonou Gelsomina, sua parceira de andanças e chora profundamente. Nesse instante, ao encontrar-se consigo mesmo, com sua torpeza e egoísmo,defronta-se com o Totalmente Outro e essa é uma intensa experiência espiritual que o filme revela. Também os monges em Homens e Deuses, ao decidirem permanecer na Argélia, sabem que aquele é o seu único lugar no mundo e que não haverá outro.Fiel à sua vocação realista, o Cinema tem a possibilidade de expressar uma vivência mais vertical da problemática humana, integrando o sagrado àquilo que está perante todos, todos os dias, no mundo que se manifesta a cada um de modo diferente, sendo sempre, porém, o mesmo mundo.


É a capacidade de desvelamento do real o que fascina no Cinema, não mais condenado a traduzir, a representar uma verdade que lhe é exterior, mas ser um instrumento de revelação que conta com os movimentos interiores do espectador, libertando-o da necessidade de acompanhamento das evoluções previsíveis das narrativas e dos significados do cinema clássico.Nesses movimentos e percursos sempre haverá espaço para a indagação humana: por que existe alguma coisa ao invés de nada? Por que sempre buscamos esse ALGO, essa dimensão da vida que a Poesia e o Mistério parecem por vezes tocar?Certos filmes possibilitam experiências que apontam na direção de uma espiritualidade que compartilha valores básicos, entre crentes e não crentes, valores fundamentais que incorporam a dimensão do sagrado ao cotidiano, fazendo disso um modo de conhecer e apreender determinadas dimensões do real que afasta a todos nós dos fundamentalismos que profanam a vida.


Ney Costa Santos
Professor do Departamento de Comunicação da PUC-Rio

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Juventude será tema da Campanha da Fraternidade em 2013


Fraternidade e Juventude. Este será o tema da Campanha da Fraternidade de 2013. A escolha foi feita hoje, 15, pelo Conselho Episcopal Pastoral, que está reunido desde ontem na sede da CNBB. O tema foi proposto pelo Setor Juventude da CNBB, que recolheu cerca de 300 mil assinaturas junto aos jovens do Brasil. O lema será escolhido na próxima reunião do Consep. 

O Setor da Mobilidade Humana da CNBB apresentou e defendeu o tema do tráfico de pessoa humana e o trabalho escravo. Outros temas foram apresentados, mas não receberam votos. Esta será a segunda Campanha da Fraternidade sobre a Juventude. A primeira foi realizada em 1992 com o lema “Juventude, caminho aberto”.

A escolha dos temas da Campanha da Fraternidade é feita com antecedência de dois anos.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

80 anos de João Gilberto

Em 50 anos, foram onze álbuns gravados em estúdio e metade desse número de discos ao vivo - cinco e meio. Menos de 17 discos de registro do som que tanto impacto causa na música há 50 anos: a voz e violão de João Gilberto. Nesta sexta-feira (10), em que João Gilberto completa 80 anos de vida, o assombro e a influência que sua arte ainda inspiram são os mesmos de quando lançou “Chega de Saudade”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, em 1959. João Gilberto já sabia tudo: constantemente reinventando e evoluindo suas canções e interpretações, toda sua obra é lida como a evolução de uma sonoridade única, elaboradamente simples e infinitamente sofisticada.

Leia sobre cada um dos discos de João: do primeiro, lançado em 1959, até o mais recente, de 2004
"Chega de Saudade" (1959)
Depois de participar do disco “Canção do Amor Demais” (de Elizeth Cardoso) e lançar dois 78 rotações em 1958, João Gilberto chegou à modernidade dos LPs ajudando a inventá-la. A voz íntima do ouvido, o som de violão absolutamente claro, a abordagem ao mesmo tempo casual e lapidada: eram muitos elementos novos que somavam àquele núcleo de criação exemplar. Além da remodernização de antigos sambas da década de 40 - um Dorival Caymmi, um Marino Pinto, dois Ary Barrosos -, contribui muito com o sabor de novidade a presença do produtor Tom Jobim, com três canções, seus pianos discretos e seus arranjos cheios de pequenos detalhes nas cordas e sopros, como contracantos de João.
Grande momento: “Morena boca de ouro”, releitura de um sucesso de 1941 de Ary Barroso, na voz de Silvio Caldas, aqui com o piano de Tom Jobim e a economia do arranjo impressionantes até hoje.
"O Amor, o Sorriso e a Flor" (1960)
O segundo LP de João Gilberto já começava ousado na capa, em preto-e-branco solarizado, criada por Cesar Vilela, que em breve faria as famosas capas da gravadora Elenco. Gravado pouco mais de seis meses depois do primeiro disco, e novamente com direção musical de Tom Jobim, o álbum trazia no repertório seis novas canções do produtor, mais um Caymmi e um antigo sucesso nunca gravado do tempo de conjuntos vocais: “O Pato”.
Grande momento: Abrindo com vocalises que reinventam as harmonias da versão original do conjunto vocal Anjos do Inferno, de 1945, “Doralice”, de Caymmi, ganha versão definitiva com João Gilberto, em nada além de um minuto e 29 segundos. De acompanhamento, além de seu violão e leve percussão, a modernidade do piano delicado e cristalino de Tom Jobim e breves comentários da flauta no contraponto.
"João Gilberto" (1961)
No mesmo fôlego, um ano depois foi gravado o terceiro LP, homônimo, de João Gilberto. Em algumas faixas, acompanhado do conjunto do pianista Walter Wanderley, todo o resto novamente com Tom. Além de três novas do produtor, o repertório continua lembrando antigos sambas dos anos 40, desta vez com dois Caymmis, um Geraldo Pereira e um Bide/Marçal.
Grande momento: “A primeira vez”, samba de Bide e Marçal cantado por Orlando Silva em 1939, surge em versão quase invertida: o volume do original é traduzido em arranjo quase solo de voz-e-violão, apenas com o piano ocasional de Tom.
"Getz/Gilberto" (1964)
E então, o mundo descobriu. Gravado em Nova York ao lado do saxofonista Stan Getz (e com Tom ao piano), o álbum foi lançado pela gravadora de jazz Verve e se tornou famoso em todo o planeta, ganhando cinco prêmios Grammy. Cantada pela mulher de João, Astrud, “Girl from Ipanema” saiu em single e vendeu mais de um milhão de cópias - a canção se tornou uma das mais regravadas da história.
Grande momento: O máximo de sublime de João em disco se revela em sua interpretação de “Pra machucar meu coração”, do então recém-falecido Ary Barroso, que João muito admirava e havia acabado de conhecer. Perfeição no piano de Tom, sax de Getz, baixo e bateria de Tião Neto e Milton Banana, e João, no seu mais suave e musical.
"Getz/Gilberto II" (1964)
O primeiro disco ao vivo de João, gravado no Carnegie Hall em outubro de 1964, lado B de um LP com Stan Getz do outro. Na versão em CD, cinco faixas bônus trazem João e Getz juntos, com Astrud.
Grande momento: Apesar de não manter a aura de magia do encontro em estúdio, “Você e eu” ao vivo é mais um interessante encontro do violão ritmado do João com o sax jazzístico de Getz e a voz vaporosa de Astrud.
"En Mexico" (1970)
Gravado durante temporada de João Gilberto no México, como já fica claro no título, o álbum só foi gravado seis anos depois do último, e desta vez com arranjos de Oscar Castro Neves. Entre as novidades do repertório, três boleros, dois Jobins, duas autorais sem letra e uma composição de seu amigo João Donato gravada dois anos antes por Sergio Mendes: “The Frog”.
Grande momento: João canta tão próximo do microfone que sua respiração funde-se com sua voz com inigualável efeito de intimidade com o ouvinte em “Astronauta” (também conhecida como “Samba da pergunta”), só com seu violão, piano pontuando e etéreas cordas ao fundo.
"João Gilberto" (1973)
O auge do minimalismo zen de João, gravado novamente em Nova York. Desta vez acompanhado apenas do percussionista Sonny Carr e, em uma faixa, da voz de sua então nova esposa, Miúcha. Além de um Jobim, três faixas sem letra e mais alguns sambas antigos, a grande novidade são canções de Caetano Veloso e Gilberto Gil.
Grande momento: É irresistível acompanhar as harmonias vocais que João cria em contracanto com Miúcha em “Isaura”, sua versão do samba de 1945 de Francisco Alves. João, virtuose dos detalhes.
"Best of Two Worlds" (1976)
Com repertório baseado no chamado “álbum branco”, de três anos antes, traz novo encontro com Stan Getz, mais de dez anos depois do “Getz/Gilberto” original. Duas faixas são cantadas solo por Miúcha e uma novidade do repertório é “Retrato em Branco e Preto”, parceria do irmão da noiva, Chico Buarque, com Tom Jobim.
Grande momento: Cantada com serenidade e emoção por João, “Ligia” é uma novidade de Tom Jobim até hoje: João canta a primeira versão da letra, diferente da que depois ficou mais conhecida, com retoques de Chico Buarque. Getz aparece com dois solos dobrados, sobrepostos com melodias diferentes.
Amoroso" (1977)
Trazendo composições em inglês, italiano e espanhol e arranjos de orquestra do alemão Claus Ogerman - que havia cuidado da orquestra nos discos solo de Tom Jobim -, “Amoroso” foi desde seu lançamento recebido como momento de gala para João e é até hoje um dos álbuns mais conceituados entre jazzistas.
Grande momento: Não é nem preciso entender a letra em italiano de “Estate” para ficar tocado com sua sensibilidade. Lendo-se, então, o “verão que criou nosso amor” e agora é um “legado de dor”, emocionante.
"João Gilberto Prado Pereira de Oliveira" (1980)
Segundo disco ao vivo de João, de um especial de TV da Rede Globo com plateia, orquestra e participações de sua filha Bebel Gilberto (então com 14 anos) e Rita Lee. Johnny Alf e Lamartine Babo são surpresas do repertório.
Grande momento: Antiga marchinha de 1939 de Lamartine Babo, cantada por Mário Reis em dueto com Mariah, vira pura bossa com a voz da tropicalista Rita Lee, interpretações em pura doçura.
"Brasil" (1981)
Gravado com Caetano Veloso, Gilberto Gil e Maria Bethânia: o violão de João, comentários dramáticos nas cordas e percussões e as quatro vozes se fundindo - Bethânia canta suave como nunca antes ou depois. Quase um disco conceitual sobre a Bahia, com versões de Caymmi, Ary Barroso e, novidade, Os Tincoãs.
Grande momento: Versão do standard americano “All of me” pelo letrista Haroldo Barbosa, “Disse alguém” é uma pérola, com João fazendo uma adaptação jazzística da sua batida ao violão, pequenas alterações na melodia e toda uma nova cor nas imagens em português.
"Ao Vivo em Montreux" (1986)
Terceiro disco ao vivo e um dos melhores momentos de João no palco, foi gravado - todo de voz e violão - no famoso festival de jazz suíço em 1985 e lançado em LP duplo, depois CD simples com duas músicas a menos.
Grande momento: O antigo sucesso de 1948 de Haroldo Barbosa na voz d’Os Cariocas, “Adeus América”, ganha todo um novo contexto na voz mântrica de João Gilberto, que tanto tempo morou nos Estados Unidos e havia retornado ao Brasil há pouco.
"João" (1991)
Com arranjos de cordas do americano Clare Fischer sobre a base de violão e voz de João, o disco não atinge os mesmos níveis de Amoroso, mas tem ótimo repertório, com Noel Rosa, Cole Porter, bolero, chanson.
Grande momento: João parece ter total controle sobre como fazer o tempo parar, andar para frente ou para trás em seus ritmos de violão e andamentos vocais. Em “Eu sambo mesmo”, de Janet de Almeida, cantada pelos Anjos do Inferno em 1946, o sublime é atingido já nos primeiros segundos.
    "Eu Sei Que Vou Te Amar" (1994)
    O quarto disco ao vivo de João e o mais sem graça, com mixagem imperfeita, edição brusca e repertório sem surpresas. “Você não sabe amar” é boa surpresa.
    Grande momento: “Lá vem a baiana”, de Caymmi, sempre perfeito na voz de João.
    "Live at Umbria Jazz Fest" (1996/2002)
    Quinto disco ao vivo de João, gravado na Itália em 1996 e lançado em CD em 2002. Mais atualizações de canções de todas as fases da carreira de João.
    Grande momento: “Isto aqui o que é?”, de Ary Barroso, tão conhecida e sempre tão nova com João.
    "Voz e Violão" (1999)
    Produzido por Caetano Veloso, foi o último de estúdio gravado por João e o único inteiramente só de voz e violão. O repertório recupera sambas antigos de Bororó, Herivelto Martins, uma raridade de Tom Jobim, dois Caetanos e novas lapidações de “Chega de saudade” e “Desafinado”, cada vez mais sintéticas.
    Grande momento: Dessa vez João Gilberto não foi tão longe, apenas 1980, para encontrar uma maravilha. “Você vai ver” foi lançada no álbum Terra Brasilis, de Tom Jobim, como uma elegante canção de fim de amor, aqui transformada em pura candura.
    "In Tokyo" (2004)
    País que cultua João Gilberto talvez até mais que o Brasil e recebe visitas frequentes para turnês, o Japão rendeu o mais recente disco ao vivo de João, sexto de sua carreira. Gravado em 2004, João tinha então 73 anos e faz ótima performance, tranquila e depurada.
    Grande momento: Aracy de Almeida cantava “Louco” de Wilson Batista em 1946, e desde os anos 50 João a traz em seu repertório, apesar de nunca tê-la gravada em estúdio. Canta ao vivo a história do louco que chora e anda pelas ruas, virando até um vagabundo.
    Fonte: Musica UOL

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Os alunos de Rembrandt

Tête du PèlerinAté o dia 18 de julho, o Museu de Louvre, na França, oferece uma excepcional viagem artística e espiritual na exposição “Rembrandt e sua relação com Cristo”.

O texto é de Isabelle Francq e publicado pela revista francesa La Vie, 21-04-2011.
Em 1629, aos 23 años, Rembrandt pintou Le Repas d’Emmaüs [A refeição de Emaús]. Um pequeno quadro a óleo (conservado no Museu Jacquemard-André, em Paris), em que, em um primeiro plano, vê-se uma silhueta posicionada em frente ao brilho de uma vela que ilumina aquele que está diante dela e a perscruta. Assim, Cristo aparece irradiando a luz, mas permanece totalmente na sombra, em todo o seu mistério e sem que se possa distinguir seus traços.

Em 1648, o mestre flamengo pintou “Les pélerins d’Emmaüs”  [Os peregrinos de Emaús] (conservado no Museu do Louvre). Desta vez, Cristo aparece de frente, mostrando um rosto sem beleza alguma, mas cheio de humanidade. Entre os tempos e ao longo de sua vida, a exposição do Louvre demonstra a figura de Cristo pintada por Rembrandt. Além de cenas de pregação, de milagres e crucificação, ele pintou uma série de sete faces de Cristo dos quais não se conhece a cronologia e sem que se saiba se se trata de estudos preparatórios ou de obras definitivas.

De todas as formas, Rembrandt compôs esses retratos de Cristo na época em que se representavam sobretudo cenas bíblicas. Pela primeira vez, esses sete quadros são reunidos. É preciso correr para vê-los no Louvre. Entrar na marcha artística desse gênio da pintura e desse leitor questionador da Bíblia em busca da verdade de Jesus. Voltando as costas para o academicismo da sua época e às representações de um Cristo de uma beleza ideal, vê-se nas figuras de Rembrandt uma paleta de emoções cheias de humildade, de doçura e de fragilidade. Em resumo, encontramos um homem.

E é nessa sua humanidade que Rembrandt busca nos dizer Deus. Para chegar lá, ele se inspirou em modelos vivos. Por uma questão de autenticidade, ele pode tê-los escolhido na comunidade judaica de Amsterdam…

Fonte: IHU online