A um jovem Poeta

Você, que ainda é puro e sabe o quão fundamental é ela para a sua aventura de poeta, fica irado contra os outros, ao sentir que a sua presente agressividade é fruto de um complexo de culpa. É você, não os outros, quem está em crise. E se os outros também o estiverem, razão a mais para você afirmar-se em sua luta, que é a luta de todo poeta, para ajudá-lo a sair dela. Pois você não auxiliará ninguém, muito menos a si mesmo, se seu coração não estiver limpo de ressentimento e sua luta contra "o outro" não for constante. "O outro", não preciso dizer, é você próprio. É o súcubo que, todos, temos dentro de nós; o ser calhorda, comprável com a moeda da mentira e da lisonja, que de repente adota a gratuidade como norma, por isso que a paixão é mais insaciável que o infinito aberto em cima. E a paixão não se vende nunca.
Cada poeta é uma coisa em si, mas todos os poetas devem o mesmo à Poesia: a própria vida. Há, o poeta, que queimar-se e causar sempre mal-estar aos que não se queimam. Há que ser o grande ferido, o grande inconformado, o grande pródigo. Há que viver em pranto por dentro e por fora, de alegria ou de sofrimento, e nunca dizer "não" a ninguém, nem mesmo àqueles que optaram pelo não chorar.
Você meu caro Jovem Poeta, que foi dotado de talento e de beleza, não tem o direito de negar-se ao seu martírio. Só ele pode tornar a sua poesia emocionante. Só ele pode salvá-lo do formalismo em que caem os que se recusam a estar sempre despertos. É preciso que todos vejam a luz que seu coração transverbera, mesmo coberto por bons panos. Não negue o seu olhar de poeta aos homens que precisam dele, mesmo tendo o pudor de confessá-lo. Abra a sua camisa e saia para o grande encontro.
Vinicius de Moraes

domingo, 28 de fevereiro de 2010

“O Amor Segundo B. Schianberg”


Tranque um ator e uma videoartista num apartamento, ligue algumas câmeras e deixe o tempo passar. Dito de forma muito simplificada, esse é o ponto de partida de “O Amor Segundo B. Schianberg”, o mais arriscado – e experimental – projeto na bem-sucedida carreira do cineasta Beto Brant.


Depois de três filmes policiais, dois deles excelentes (“Os Matadores”, em 1997, e “O Invasor”, em 2001), Brant consolida com “O Amor Segundo B. Schianberg” uma guinada surpreendente em sua carreira.


Ao adaptar, em 2005, “Crime Delicado”, a novela de Sergio Sant´Anna sobre a paixão de um crítico por uma mulher sem a perna, Brant deu a deixa que seu cinema ambicionava ir além da crítica social e política. A impressão se confirmou na sua obra seguinte, “Cão sem Dono”, de 2007, extraído de um romance de Daniel Galera, no qual o foco vem a ser o relacionamento improvável entre um tradutor deprimido e uma modelo exuberante.


“O Amor Segundo B. Schianberg” parece um desdobramento de “Cão sem Dono”. Se no filme anterior a ação se passava em diferentes ambientes de Porto Alegre, neste agora concentra-se, basicamente, entre quatro paredes. E mais, Brant filma o seu casal de forma pouco ortodoxa, com som aberto para todos os ruídos e ângulos improváveis.


O ator Felix (vivido por Gustavo Machado) e a videoartista Gala (Marina Previato) são filmados como se estivessem participando de um reality show. Somos convidados a compartilhar da intimidade do casal, que assistimos comendo, namorando e trabalhando. Também acompanhamos, sem ouvir direito, as conversas da dupla sobre a própria relação, sobre amor, sobre arte, enquanto Gala faz um vídeo, que será exibido na conclusão do filme.


O título do filme, “O Amor Segundo B. Schianberg”, já diz bastante das intenções metalinguísticas de Brant. Benjamin Schianberg é um personagem do romance “Eu receberia as piores notícias de seus lindos lábios”, de Marçal Aquino. Apresentado como “filósofo do amor”, é o autor de uma obra a que Marçal recorre com freqüência na construção da narrativa, o livro de auto-ajuda “O que vemos no mundo”.


“O Amor Segundo B. Schianberg" constrói-se, assim, como um filme dentro de um filme discutindo o tempo toda a própria ideia de representação. Trata-se, evidentemente, de uma proposta para um pequeno público, interessado em pensar o cinema, as suas possibilidades e os seus limites.

Fonte: cinemauol.com.br

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